quarta-feira, 22 de janeiro de 2025



Os cientistas descobriram que a fecundação não é fruto de uma corrida de espermatozoides, no qual o mais rápido é aquele que fecunda. Isso muda tudo. Não surgimos de uma competição, não temos a disputa em nosso DNA. Nós surgimos de uma dança... a passos lentos, onde não é o espermatozoide que vai até o óvulo, mas este que o seduz. 

Os pesquisadores ficaram estarrecidos ao observarem que o óvulo não tem uma postura passiva (como se esperava) e pode, como um aceno, dizer "não". Ao mesmo tempo, o óvulo também seduz aquele que quer fecundar, e como numa coreografia, o gameta feminino libera uma substância no qual atrai e controla aquele que é escolhido. Os químicos, por falta de poesia, chamam essa substância de quimioatraentes. Os poetas chamariam apenas de amor. O espertozoide não venceu uma corrida. Ele foi seduzido. 

E isso deixa tudo mais bonito. 

Assim, devemos mudar a alegoria que contamos para as crianças. Porque não é o pai que coloca a sementinha numa espécie de vazo pronto para florescer qualquer semente. Mas, justamente, o contrário: é a mãe, enquanto semeadora, que vai escolher a semente que irá florescer. Olha, eu já consigo imaginar os gametas dançando, se divertindo (como deve ser bonito o milagre da vida) ao invés daquela corrida cafona. O óvulo tem, aproximadamente, o tamanho de um grão de areia. Ou de uma estrela. Dependendo da perspectiva, já que não podemos alcançá-las. E se aos olhos nu o grão e a estrela são quase do mesmo tamanho, é bem mais charmoso levar um corpo cósmico no ventre. Ironicamente, isso torna o início o mesmo estágio do fim, do nascimento e morte. Pois é assim como explicamos a morte para as crianças: "Ele virou uma estrelinha no céu..." 

Parece um jeito ingênuo de ensinar, mas se o big bang deu origem a isso, temos em cada átomo nosso uma partícula dessa explosão inicial. Querendo mentir, para minimizar a dor, acabamos por revelar a verdade. Como já disse Gerome Morrow: "Dizem que cada átomo do nosso corpo um dia foi estrela. Talvez não estejamos morrendo. Talvez só estejamos voltando para casa." E assim como a estrela que brilha já pode ter morrido (e nós enxergamos a luz de algo que sequer existe) nós podemos também ser essa luz que expande, ilumia para além da vida. Tudo depende de como vamos gastar essa vida e realizar a nossa explosão particular. Somos uma poeira cósmica - e desbancando qualquer arrogância de quem se deseja exato, essa é a lição mais poética que podemos aprender com a física. 

Agora, pedindo licença aos cientistas, poderíamos imaginar  - enquanto uma poesia - o zigoto, essa primeira célula do novo ser, que precisa compartilhar, se dividir, multiplicar, enfim, explodir, para gerar um embrião. Esse é o nosso big ban, a explosão da nossa estrela que gera a vida. Assim, por que não imaginar que antes da explosão - esse grande enigma que nos aflige - existia uma dança? 

E Deus seria um par se seduzindo, se amando, antes do estampido, do estrondo, da rebentação. Dançando, numa coreografia do caos, em meio ao estouro, e desse deslumbramento, vem a vida.